quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Governo quer utilizar a Internet para jogar sujo contra opositores - Oswaldo Catengue




Luanda -  Recuperando uma recente estratégia do Irão, denunciada pelo jornal britânico The Guardian, as autoridades do regime angolano/MPLA/JES estudam nesta altura a possibilidade de criar blogues e jornais on-line fictícios para intimidar e descredibilizar intelectuais e jornalistas que, a partir do estrangeiro, denunciam as arbitrariedades das autoridades de Luanda.

Fonte: Folha8

Tal como no Irão, especialistas informáticos brasileiros, portugueses e angolanos, obviamente contratados pelo regime de Luanda, estão preparar a colocação de notícias falsas em páginas na Internet, em falsos blogues, bem como a inventar contas na rede social Facebook, de modo a espalhar falsas informações sobre a vida desses opositores, bem como das suas famílias, criando um clima de descredibilização e de medo.
Importa, por isso, reter o que está a fazer o Irão porque a todo o momento a Internet vai aparecer com a mesma metodologia mas com um novo protagonista – Angola. Em Portugal, fontes ligadas aos opositores (estes são todos aqueles que não alinham com o MPLA), sobretudo no meio académico e do jornalismo, falam já de “sérios indícios”, considerando que muitos jornalistas “não podem escrever nos seus órgãos de trabalho o que se passa em Angola, mas como o fazem noutras plataformas, passaram a ser o alvo principal da nova estratégia difamatória e intimidatória de Luanda”.
Na impossibilidade de controlarem a Internet, os mais ortodoxos do regime angolano apostam forte nessa tentativa de massificar a difamação e a intimidação, antevendo que acabarão por silenciar os seus opositores.
Se até nas democracias mais ou menos consolidadas cresce a apetência pelo controlo da comunicação, então nos regimes autoritários essa estratégia assume contornos assustadores para a liberdade.
Ainda recentemente os jornalistas de um dos mais conhecidos semanários chineses, o Nanfang Zhoumo, de Cantão, fizeram greve, num invulgar e provavelmente suicida protesto contra a intervenção das autoridades na sua linha editorial.
"É a primeira vez em mais de duas décadas que o departamento editorial de um grande jornal da China promove abertamente uma greve contra a censura governamental", salienta o South China Morning Post de Hong Kong.
Cantão é a capital da província de Guangdong, uma das mais prósperas da China, situada na costa sul do país, que confina com Macau e Hong Kong.
Sem perder de vista o que se passa com os nossos órgãos oficiais do regime, atente-se que os jornalistas do Nanfang Zhoumo acusaram o director do departamento de propaganda de Guangdong, Tuo Zhen, de ter alterado o editorial de ano novo do semanário.
E, por mero acaso – é óbvio, a alteração transformou um apelo a favor do "constitucionalismo" e de reformas políticas num tributo ao papel dirigente do Partido Comunista.
Entretanto, milhares de intelectuais, jornalistas e internautas assinaram uma petição contra a censura e 27 académicos do continente, Hong Kong e Taiwan, entre os quais destacados juristas e economistas, apelaram à demissão de Tuo Zhen, o tal director do departamento de… propaganda.
Tal como em Angola, de acordo com a Constituição chinesa, "os cidadãos da República Popular da China têm direito à liberdade de expressão, de imprensa, reunião, associação e manifestação".
Como se todo este cenário já não fosse assustador, registe-se que o número de jornalistas presos a nível mundial atingiu em 2012  um recorde, num total de 232 repórteres atrás das grades, segundo o Comité para a Protecção dos Jornalistas (CPJ). Ou seja, mais 53 do que em 2011 e o valor mais elevado desde que a organização começou a realizar a contagem, há 22 anos.
Os três países com maior número de jornalistas presos são a Turquia com 49 detidos, o Irão com 45 e a China, onde 32 repórteres se encontram na cadeia.
“Estamos a viver numa era em que as acusações de se ser contra o Estado e o rótulo de ‘terrorista’ se tornaram nos meios preferidos dos governos para intimidar, deter e prender jornalistas”, afirma o director executivo do CPJ, Joel Simon.
Para o dirigente da organização, “criminalizar a cobertura de tópicos inconvenientes viola, não apenas a lei internacional, mas impede os direitos dos povos do mundo de reunirem, disseminarem e receberem informação independente”.
Veja-se o cenário vivido na Turquia não parece o que temos à porta de casa. No país que conta com o maior número de jornalistas na prisão, as autoridades mantêm detidos “dezenas de repórteres curdos e editores sob acusações ligadas a terrorismo e outros jornalistas por alegadamente conspirarem contra o Governo”.
O editor da televisão turca Kanal D, Mehmet Ali Birand, afirmou, citado pelo CPJ, que os estatutos legais naquele país “não distinguem entre jornalistas que fazem uso da liberdade de expressão e indivíduos que apoiam terrorismo”, apelidando as leis anti-Estado de “uma doença nacional”.
Já o Irão, segundo a organização sediada nos EUA, prossegue a repressão iniciada depois das eleições presidenciais de 2009.
Por seu lado, na China, 19 dos 32 jornalistas presos são tibetanos ou uigures, na cadeia por documentarem as revoltas iniciadas em 2008 naquelas regiões.
Ainda assim, a Eritreia é classificada como o maior violador de procedimentos devidos, com 28 jornalistas detidos, sem que qualquer deles tenha sido acusado publicamente por um crime ou levado a tribunal.
“Temos de lutar contra governos que procuram cobrir as suas tácticas repressivas com a bandeira do combate ao terrorismo. Devemos avançar com mudanças legislativas em países onde o jornalismo crítico está a ser criminalizado e defender todos aqueles que estão na prisão”, afirma Joel Simon, acrescentando que deve garantir-se que “a Internet em si permanece uma plataforma aberta e global”.
O relatório do CPJ realçou, ainda, que pela primeira vez desde 1996 nenhum jornalista da Birmânia se encontrava preso, enquanto Cuba foi o único país das Américas a regressar à lista.
Na frente portuguesa, recorde-se que criticar o regime de José Eduardo dos Santos é assinar a sentença de morte… profissional. Pelo menos esta.
Relembre-se que uma crónica crítica em relação a Angola, do jornalista Pedro Rosa Mendes, levou a RDP a acabar com o espaço de opinião "Este Tempo", da Antena 1.
O próprio jornalista Pedro Rosa Mendes afirmou: “Foi-me dito que a próxima crónica seria a última porque a administração da casa não tinha gostado da última crónica sobre a RTP e Angola”.

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